Brasil de Flato, o blog

sexta-feira, março 31, 2006

A esquerda e o desenvolvimentismo

Estou meio sem tempo para escrever, por isso, publico um texto de José Fiori, retirado no site da Carta Maior. O texto é bastante esclarecedor, pois explicita de maneira sintética sem simplismos aquilo que também penso sobre um dos mais importantes dilemas atuais da esquerda brasileira.
A esquerda e o desenvolvimentismo
Não é de estranhar a dificuldade atual do “desenvolvimentismo” para recuperar audiência e fôlego teórico, e deixar de ser apenas uma trincheira de resistência pontual, e de contenção limitada de alguns excessos ou demasias neoliberais, dos próprios social-democratas.
José Luís Fiori
Toda reconstrução histórica é um pouco arbitrária e imprecisa. Mas feita esta ressalva, se pode afirmar que o “desenvolvimentismo” latino-americano nasceu no México, durante o governo do presidente Lázaro Cárdenas, na década de 1930. Cárdenas foi nacionalista e seu governo fez uma reforma agrária radical; estatizou a produção do petróleo; criou os primeiros bancos estatais de desenvolvimento industrial e de comercio exterior da América Latina; investiu na construção de infra-estrutura; praticou políticas de industrialização e proteção do mercado interno; criou uma legislação trabalhista e adotou uma política externa independente e antiimperialista.Depois de Cárdenas, com pequenas variações, este programa se transformou no denominador comum de vários governos latino-americanos, que depois foram chamados de “nacional-populares” ou “nacional-desenvolvimentistas”, como foi o caso de Vargas, no Brasil, Perón, na Argentina, Velasco Ibarra, no Equador e Paz Estenssoro, na Bolívia, entre outros. Nenhum deles era socialista, nem muito menos marxista, pelo contrário, eram quase todos conservadores, mas suas idéias, políticas e posições internacionais também se transformaram na referencia obrigatória da esquerda latino-americana. Depois de 1930, e em particular depois que os Partidos Comunistas latino-americanos adotaram uma estratégia democrática e reformista de conquista do poder e transformação do sistema capitalista, a relação da esquerda com o “desenvolvimentismo” transformou-se no núcleo duro de sua produção intelectual e política. Foi o que ocorreu em quase todos os países do continente, pelo menos entre 1930 e 1980. Não é difícil, por exemplo, encontrar a inspiração “cardenista” nos programas da revolução camponesa boliviana, de 1952 e no governo democrático de esquerda de Jacobo Arbenz, na Guatemala, entre 1951 e 1954. Como também, na primeira fase da revolução cubana, entre 1959 e 1962 e no governo militar e reformista do general Velasco Alvarado, no Peru, entre 1968 e 1975. Idem, no caso do governo de Salvador Allende, no Chile, entre 1970 e 1973.No Brasil, entretanto, esta relação entre a esquerda e o desenvolvimentismo, seguiu uma trajetória absolutamente original, graças a dois acontecimentos da década de 1930 que marcaram definitivamente a história do país. O primeiro, foi o desaparecimento precoce da Aliança Nacional Libertadora (ANL), a primeira grande mobilização democrática nacional e urbana, de classe média e de centro-esquerda, que ocorreu no Brasil e foi abortada e dissolvida prematuramente, depois do fracasso da rebelião militar comunista, de 1935. E o segundo, foi o golpe de estado de 1937, que inaugurou o governo autoritário do Estado Novo de Getulio Vargas e suas primeiras políticas industrializantes e trabalhistas que tiveram uma forte conotação anticomunista e anti-esquerdista.Por isto mesmo, a esquerda brasileira só se aproximou e reconciliou com algumas teses e propostas do “desenvolvimentismo conservador” de Vargas, na década de 50 e sobretudo, durante o governo de JK. Foi quando o Partido Comunista Brasileiro (PCB) abandonou sua estratégia revolucionária, e assumiu a defesa de um projeto de “desenvolvimento nacional” que deveria ser liderado pela burguesia industrial brasileira. Teses e propostas que transcenderam as pequenas fronteiras partidárias do PCB e influenciaram fortemente toda a intelectualidade de esquerda no Brasil.Mais à frente, no início da década de 60, esta nova esquerda “nacional-desenvolvimentista” propôs um programa de “reformas de base” que acelerassem a democratização da terra, da educação, do sistema financeiro e do sistema político, que foram incluídas, pelo menos em parte, no Plano Econômico Trienal proposto pelo Ministro do Planejamento Celso Furtado, em 1963, e abortado pelo golpe militar de 1964. É importante relembrar, entretanto, que naquele mesmo período, a estratégia “nacional-desenvolvimentista” foi duramente criticada por um outro segmento da esquerda, um grupo de intelectuais marxistas, da Universidade de São Paulo, liderados pelo professor Fernando H. Cardoso, Mas este grupo não chegou a propor nenhuma alternativa, naquele momento, ao programa das “reformas de base”, e ao Plano Trienal de Celso Furtado. Nas décadas seguintes, a relação entre a esquerda e o desenvolvimentismo complicou-se ainda mais, depois que o regime militar, instalado em 1964, abandonou suas primeiras posições ultra-liberais e retomou o caminho do desenvolvimentismo conservador e autoritário, na década de 70, reavivando as lembranças e os velhos traumas da esquerda. Talvez por isto, quando a esquerda brasileira volta à cena política democrática, na década de 80, a maior parte de sua militância juvenil já tinha um forte viés anti-estatal, anti-nacionalista e anti-desenvolvimentista, e considerava que a organização social e a defesa dos direitos da sociedade civil - através dos “movimentos sociais” e das “organizações não governamentais” - era mais importante que a luta política pelo poder do estado.Assim mesmo, alguns intelectuais e políticos “mais velhos” propuseram reformar, aprofundar e democratizar o desenvolvimentismo sob a égide de um “estado de bem estar social”, alcançado vitórias significativas na Constituição de 1988. Mas depois, na década de 90, foram derrotados sistematicamente, no campo das idéias e da luta pelo poder, pelos herdeiros do “marxismo paulista” dos anos 60, que combinaram num mesmo projeto, sua intolerância com o nacionalismo, o desenvolvimentismo e o populismo e sua proposta alternativa de um novo tipo de desenvolvimento “dependente e associado” com os Estados Unidos só compatível com as políticas e reformas neoliberais.Este “pacote intelectual” nasceu em São Paulo e penetrou profundamente a intelectualidade dos dois partidos social-democratas que também nasceram naquele estado, o PSDB e o PT. Por isto, não é de estranhar a dificuldade atual do “desenvolvimentismo” para recuperar audiência e fôlego teórico, e deixar de ser apenas uma trincheira de resistência pontual, e de contenção limitada de alguns excessos ou demasias neoliberais, dos próprios social-democratas.

quinta-feira, março 16, 2006

PSDB decidiu abrir mão da vantagem do empate

Ao escolher Geraldo Alckmin, ao invés de José Serra, para a disputa da presidência da República, o PSDB abriu mão da vitória caso o número de votos da eleição para seu candidato e para Lula seja igual. Isto porque a lei eleitoral determina que em caso de empate em número de votos, o mais velho será considerado eleito. José Serra, nascido em 1942, teria vantagem sobre Lula, nascido em 1945, mas Geraldo Alckmin, nascido em 1952, não.

Ainda sobre o filme "Ponto Final"

"Ponto Final" – o fatalismo de Woody Allen

Filme apresenta a vida humana como uma seqüência de acasos que comandam os acontecimentos e os destinos.

Marcos Arruda

O filme de Woody Allen, “Ponto Final” (Match Point) é muito bom cinema; mas é também um filme alienador pelo seu fatalismo. História de suspense, muito bem construída, que mantém a atenção do espectador pendurada no fio da narrativa. Utiliza com argúcia grandes planos das faces dos personagens para explorar com minúcia seus sentimentos. O enredo é original e a conclusão do filme é tão inesperada quanto a de uma boa piada. Mas não é piada nenhuma, ao contrário. No Brasil, país da impunidade, este filme cai como uma luva para justificar que grandes criminosos de colarinho branco ou gravata borboleta, por um mero golpe de sorte, saiam impunes das suas tramóias, tão custosas para os fundos públicos e para a ética democrática. No país da riqueza superconcentrada, o filme reforça a crença de que a ilusão da riqueza material todos seduz e todos corrompe.O que interessa explorar aqui é a filosofia veiculada pelo filme deste cineasta existencialista de Nova York. É a mesma filosofia do biólogo francês Jacques Monot, para quem a Terra é uma nave perdida no Cosmos navegando ao sabor do acaso. Woody interpreta a vida humana como uma seqüência de acasos, e são eles que comandam os acontecimentos e os destinos. Os gregos antigos davam ao acaso a personalidade de deuses, e colocavam o Olimpo como o cenário em que as interações entre os deuses se desdobravam, sempre baseadas em paixões e preferências pessoais, moldando assim os destinos humanos. Os dramas e as tragédias vividas pelos humanos eram como que reflexos dos conflitos entre os deuses.É de chamar a atenção a quase total ausência da questão da consciência e da liberdade na filosofia de Woody Allen. Em nenhum momento, exceto no discurso desesperado de Lona Rice, é levantada a responsabilidade de cada um pelas decisões a tomar. O filme é, na verdade, uma tessitura de tomadas de decisões. Mas elas passam despercebidas, dado que Woody focaliza nossa atenção, do começo ao fim do filme, no tema do acaso, da sorte ou do azar (hasard, em francês, quer dizer acaso, e não má sorte). A influência do fatalismo grego é evidente no filme, inclusive no discurso do anti-herói, que cita Sófocles para justificar suas ações: já que o acaso é que comanda nossas vidas, o melhor seria nem ter nascido. Mas já que nascemos, temos que nos conformar com a nossa “sorte”: os que ganham são os bons, pois o acaso os premiou; os que perdem são os maus, ou pelo menos os “azarados”.Woody constrói com sensibilidade o drama que vive o anti-herói na sua intimidade, nos momentos mais críticos. Ele vive momentos de desespero, de vergonha, de angústia extrema. Um olhar mais profundo verá que ele próprio está agonizando. Ao eleger as decisões que tomou, ele na verdade escolheu matar seu próprio “self”, seu eu-sou profundo. O egocentrismo que comanda seus sentimentos mais profundos o leva a tudo justificar pelo fim maior que o move: a vida de benesses da alta elite que “o acaso” lhe presenteou. Nos seus breves e intensos momentos de desespero, ele está, na realidade, fazendo o luto de si mesmo. Quem vai continuar vivendo é apenas um fantasma dele próprio. É o que fica evidente nas cenas que o colocam impassível, insensível, totalmente distante diante daquela manifestação de nova vida da qual ele é autor direto, embora não por amor ou por intencionalidade co-criadora.Enfim, Woody Allen mostra-se incapaz de examinar ou antecipar a seqüência dos sentimentos do anti-herói. O tombo do anel para o lado de cá pôs de fato um ponto final na tragédia? Para Woody, o filme termina no que considero o ponto inicial de um outro filme: a história de um morto-vivo, cercado de segurança e bens materiais, porém aprisionado à culpa resultante de sua escravidão ao binômio desejo-medo. Do ponto de vista energético, o anti-herói não é um ganhador da loteria da vida, mas um perdedor na luta pela conquista de si próprio; sua vida é a resultante de escolhas guiadas por fatores que pertencem à dimensão infra-humana do seu ser. Ele é um escravo do seu próprio Eu. Ele é a negação da liberdade. Com isto, não desejo transmitir a impressão de que estou fazendo um julgamento da pessoa do anti-herói. Ele encarna apenas os valores da cultura dominante, a cultura do individualismo extremo, do eu-sem-nós, do cada-um-por-si-e-deus-por-mim. Woody Allen contrasta, com outros cineastas contemporâneos (Ken Loach, Walter Salles Jr., Tizuka Yamazaki), que vêem no altruísmo, na cooperação e na solidariedade um sentido superior para a vida humana. Há outra maneira de conceber a vida humana. Ela seria a resultante de dois fatores que convivem em tensão dialética, numa dança que faz de cada um deles um elemento inseparável do par unificador: nossa liberdade de tomar decisões segundo o tipo e o grau de desenvolvimento da consciência que temos de nós próprios, do Outro e do Mundo; e o que a vida nos traz ao longo da caminhada. A cada esquina da vida devemos ouvir, sempre e de novo, a fala da sábia Raposa ao Pequeno Príncipe: “Tu te tornas para sempre responsável por aquele que cativas”.
Texto retirado do site da Agência Carta Maior, http://agenciacartamaior.uol.com.br, site este que adota a política do Copyleft

segunda-feira, março 13, 2006

Brasil de Flato recomenda - Filmes no cinema



Ponto Final (Match Point, Inglaterra/EUA/Luxemburgo 2005)
Gênero: Drama/Suspense
Duração: 124 minutos
Direção: Woody Aleen

Um dos melhores filmes do ano até agora, porém, para curti-lo completamente é necessário esquecer durante a exibição de que o filme é de Woody Allen. Ponto Final não tem nada a ver com as últimas comédias do diretor, como Trapaceiros, O Escorpião de Jade e Dirigindo no Escuro, que também foram bons filmes, porém completamente diferentes. Ponto Final não tem nenhuma cena engraçada. Outra diferença com as produções habituais do diretor é que Ponto Final se passa em Londres, e não em Nova York, mas parece que Woody Allen se sente em casa ao retratar a vida local.
Chris Wilton (Jonathan Rhys-Meyers) é um tenista não muito espetacular que resolve largar a vida de jogador para virar instrutor particular de Tom Hewett (Matthew Goode), filho de um inglês riquíssimo. Mostra-se refinado e acaba conquistando um espaço dentro da família. Começa a namorar Chloe (Emily Mortimer), a irmã de Tom. Mas eis que aparece a gostosíssima Nola (Scarlett Johansson), uma fracassada atriz norte-americana. Nola é namorada de Tom, mas Chris quer toda hora traçá-la. E a história não podia acabar bem.
A história do filme é a de Chris tentando e conseguindo subir na vida e sendo obrigado a escolher entre os prazeres da riqueza e os prazeres de uma gostosona. O cara é tão crápula que prefere escolher ambos. Quando o filme terminou, lembrei-me não sei porque dos 10 Mandamentos e reparei que o ex-tenista só não descumpriu o segundo (pelo que eu me lembro).
Eu já tinha visto um filme baseado em Crime e Castigo, livro de Dostoievski. Foi Nina. Achei tão ruim que fiquei traumatizado. Ponto Final, outro filme baseado na obra, superou completamente este trauma. Só existe um probleminha em ver Ponto Final: a sensação de envelhecimento. É duro morar na casa dos pais, ainda depender um pouco deles e ver no cinema uma gostosona mais jovem do que eu.


terça-feira, março 07, 2006

Brasil de Flato recomenda - Filmes no cinema


Boa Noite e Boa Sorte (Good Night and Good Luck, EUA 2005)
Gênero: Drama
Duração: 93 minutos
Direção: George Clooney
Dedico uma notinha de destaque a este filme porque embora tenha tido repercussão maior que o próprio "Crash", o vencedor do Oscar, "Boa Noite e Boa Sorte" teve menos bilheteria que "Munique" e "O Segredo de Brokeback Mountain", mesmo sendo melhor que ambos (ainda que os dois também foram muito bons).
Em 1953, o âncora Edward Morrow decide promover uma campanha contra o senador Mcarthy, o famoso caçador de comunistas, após a acusação feita pelo senador de que um militar norte-americano seria comunista por ler um jornal sérvio. Então, o próprio âncora passa a ser perseguido por Mcarthy.
O filme é bom não apenas pelo seu lado técnico, como a fotografia em preto e branco e a trilha sonora, como também tem um ótimo roteiro. E o tema "liberdade de expressão e caça às bruxas" é bastante relevante nos dias atuais, com seus atos patriotas. E práticas como a de acusar Edward Morrow de ser comunista por ter sido elogiado por um escritor britânico comunista são muito semelhantes ao conteúdo dos textos de um famoso filósofo conterrâneo meu que atualmente escreve artigos em alguns jornais brasileiros.
Outro motivo que me levou a destacar o "Boa Noite e Boa Sorte" foi a discussão do tema liberdade de expressão em tópicos anteriores deste blog. "Boa Noite e Boa Sorte" deve ter saído de cartaz, mas acredito que não demorará muito para chegar em DVD. Imperdível.

Ainda o Bono

Meus 3,4 leitores já devem estar de saco cheio de tanto ler na mídia artigos e comentários referentes ao U2, mas é exatamente o fato de eu também estar de saco cheio que me motiva a escrever este texto. O padrão da maioria dos textos que sai na mídia é dizer que o Bono é imbecil, que seus fãs são imbecis, que o autor do artigo é inteligente e esclarecidos e que os leitores do artigo são inteligentes e esclarecidos. Ora, quem furou fila para comprar ingresso, quem pediu para a vovó comprar ou quem acampou dois dias antes é realmente imbecil, mas criticá-los não torna ninguém mais inteligente.

Agora quanto ao U2, não se pode negar que fizeram dois belos shows, seja em termos de repertório, seja em termos de presença de palco, seja em termos de efeitos visuais. Tudo bem que foram dois shows idênticos, mas como pouco é improvidado e quase tudo é antecipadamente preparado, é meio difícil mesmo fazer dois shows diferentes. O que na hora pode ter emplogado menos que as músicas foram os discursos contra a miséria, a fome, a guerra, pelos direitos humanos e pela tolerância religiosa, embora no último caso tenha sido uma linda idéia criativa a faixa e o telão mostrando a palavra COEXISTA com o crescente islâmico no lugar do C, a estrela de Davi no lugar de X e a cruz cristã no lugar de T. Tais manifestações não foram tão empolgantes porque faltou um alvo definido a ser combatido. Quem seria a favor da miséria, da fome, da guerra, da violação dos direitos humanos e da intolerância religiosa? O pior é que parece que tem gente que responderia a algumas perguntas de forma afirmativa. Basta ler e ouvir os comentários dos neoconservadores cada vez mais bicudinhos. Reinaldo Azevedo e Caio Blinder, jornalistas da revista Direita Leitura sugeriram a Bono que exibisse a faixa dos três símbolos religiosos na Palestina e no Irã, querendo dizer que o islamismo não é digno de ter sua tolerância solicitada uma vez que esta religião seria intolerante com as demais. Foi um grande comentário de quem procura pêlo em ovo. Bono não tem que pedir tolerância no Oriente porque o rock é uma linguagem ocidental. O que tem demais o vocalista do U2 pedir tolerância no Ocidente e um líder que se comunique na linguagem dos orientais pedir tolerância a estes? A revista semanal mais vendida do Brasil, vulgarmente conhecida como "O Panfletão", também entrou na onda. Na tradicionail sessão das setinhas, de quem esteve por alto e quem esteve por baixo na semana, Bono teve sua setinha para baixo porque seria "muito chato ao pregar o discurso politicamente correto". O "politicamente correto" é uma doutrina que surgiu nos anos oitenta e que prega a mudança de certas palavras para evitar ofensas a minorias. Um exemplo do politicamente correto a exigência de substituir "menor" por "criança" ou "adolescente". Sou indiferente ao politicamente correto, acho inócua a tentativa de acabar com a discriminação atrás da impressão de novos dicionários. Mas tenho medo do anti-politicamente correto. Isto porque os neoconservadores passaram a denominar "politicamente correto" qualquer um que fosse contra suas doutrinas. Portanto, "politicamente correto" não era mais apenas quem queria substituir "boiola" por "homossexual", mas também quem fosse a favor do casamento homossexual, contra as guerras de Bush e contra o ensino do design inteligente. Quem acha "chata" alguma atitude é normalmente quem apóia a motivação de tal atitude, porém não concorda da maneira que é feita. Não é o caso do Panfletão, que teria sido mais honesto ao dizer não que o Bono é "chato por pregar o politicamente correto" e sim que é contra a doutrina da revista.
A raiva da direita contra Bono mostra que a direita está cada vez mais raivosa. Isto porque o líder do U2 sempre foi moderado em seu ativismo, sempre deu mais importância para o ativismo social do que o ativismo político. Esta caráter pouco politizado foi explícito antes do U2 tocar a música One, quando foi pedido que a esquerda e a direita se unissem na luta contra a miséria. Isto faz com que Bono seja criticado também por algumas pessoas de esquerda. Algumas críticas podem fazer sentido, porém, é preciso lembrar que é importante a diversidade de ativismos. É muito saudável uns fazerem opção pela militância política, outros pela social. E se Bono fizesse um discurso claramente de esquerda, teria muito menos alcance nos canais de comunicação do que tem atualmente.

Apesar de tudo, Bono Vox cometeu uma incoerência: se ele é tão pacifista, porque chamou um canhão para dançar com ele no palco?